sábado, 12 de junho de 2010

II Mostra de Cinema Ambiental de Barueri


Conhecimento é poder: assim o Movieco vai transformando mentalidades e ampliando consciências

Por Priscilla Wilmers Bruce
O silêncio é quebrado quando a voz do ator Marcos Palmeira ecoa no auditório. Traz uma mensagem do Greenpeace que sacode os pensamentos da atenta plateia, que acompanha a última noite de eventos da II semana do Meio Ambiente promovida pelo Movieco – movimento ecológico de Barueri.
Que plateia é essa e qual é o recado de Marcos Palmeira? Esses são alguns dos muitos elementos usados pelo Movieco - entidade ambientalista da cidade - na busca da construção de uma educação ambiental que conduza posturas e consciências para a urgentíssima questão da preservação do planeta. Desde 1998 a organização não governamental vem trabalhando fortemente na região de Barueri, contando com a participação de 19 mil alunos das redes pública e privada que já foram envolvidos pelas ações da entidade, como a agenda 21. A mensagem da coordenadora de projetos do Movieco, a ambientalista Tânia Mara Pereira da Silva é enfática. Diz ela: “Tudo se tenta para tocar a alma das pessoas. Queremos a mudança de comportamento. As pessoas não conseguem enxergar que fazem parte do meio ambiente, elas são o meio ambiente, estão inseridas nele.”
Com esse enfoque, foi organizada a segunda mostra de Cinema Ambiental de Barueri. Os filmes assistidos e debatidos são escolhidos a dedo; são quatro ao todo e levantam questões de grande importância, como um documentário que mostra a experiência da ambientalista queniana Wangari Maathai, ganhadora do prêmio Nobel da Paz de 2004, que promoveu o maior reflorestamento de seu país. A ambientalista convocou as mulheres da região para o trabalho de plantio de mudas nativas, e provou que pequenas e simples ações locais interferem no todo como resultado final. A carta da Terra, que tem como missão promover uma cultura de paz fundamentada na democracia, na ética e na integridade ecológica, também ganhou espaço narrada por Leonardo Boff.
Mas e o Marcos Palmeira, você deve estar perguntando? O ator que tem forte engajamento com a questão ambiental narra um filme produzido pelo Greenpeace que retrata a expansão da soja na Amazônia, que tem destruído florestas, expulsando de suas terras o nativo que ali sempre viveu, acabando com a biodiversidade que sempre foi à marca do país, muito forte na região amazônica, em Santarém, onde se passa o filme. O que está acontecendo na Amazônia de acordo com o documentário é um processo sem volta de desertificação. As florestas estão sendo derrubadas e queimadas para que o plantio da soja se efetue, pois, exige uma região muito extensa para isso. As pessoas que viviam da Terra, que não conheciam a fome, vão sendo empurradas para os bolsões de pobreza localizados nas periferias de Santarém. De volta à cidade, iludidos pela vida mais fácil, vivem rapidamente a realidade do desemprego em consequência da ausência de conhecimento em qualquer outro setor. Essas pessoas que foram despojadas de suas terras estão também desapropriadas de si mesmas. Uma viagem sem retorno para a maioria delas.
Os alunos da Escola Estadual Estevan Placêncio da aldeia de Barueri que formam a plateia, são “tocados” pela realidade do documentário, fazem perguntas, esclarecem dúvidas e vão devagarzinho fazendo o caminho proposto pela Ong Movieco: pensar sobre a importância da preservação e da sustentabilidade do meio ambiente, a casa que acolhe a todos nós. Eles vão refletindo sobre um dado profundamente doloroso e que afeta a humanidade como um todo: oitenta milhões de pessoas morrerão de fome no mundo ainda esse ano por absoluta falta de alimentos. Nesse ponto, você pode perguntar: mas o Brasil não pode fazer nada? O Brasil não é visto por aí como o “celeiro” do mundo?
Quem responde aos alunos é a permacultora e eco-designer Cristina Brasileira. Ela faz uma bela palestra sobre os meios de produção agrícolas alternativos com propostas de modelos sustentáveis que respeitam as condições locais. Diz a técnica para os curiosos alunos: “O meio ambiente está dentro da gente, e o país é riquíssimo em biodiversidade. Temos pampa, restinga, mata atlântica, cerrado (...) e o fim da biodiversidade que está ligada a nossa sobrevivência e alimentação, acabará com a vida.”.
Entre as propostas do eco-designer, para o gravíssimo problema da fome e do esgotamento do solo está a permacultura, vinculada a uma solução viável para a produção de alimentos para todo o Planeta. Em 1970, de olho no passado e nos meios de produção tradicionais e ancestrais dois pesquisadores australianos, Bill Mollison e David Holmgren, recuperaram, resgataram e aprimoraram esse meio de produção sustentável e holístico que eles uniram com os conhecimentos tecnológicos da ciência moderna. A nova filosofia que surgia dessa junção de conceitos, eles chamaram de Permacultura. Resumindo: eles organizaram um sistema evolutivo integrado de espécies vegetais e animais perenes úteis à vida humana e que fosse abundante para todos, sem prejuízo para o meio ambiente. Eles buscavam os princípios de uma agricultura permanente envolvendo aspectos éticos, socioeconômicos e ambientais que pode ser aplicada tanto no meio rural quanto no urbano. Essa é a grande diferença da Permacultura, como explica Cristina Brasileira: “A Permacultura é uma filosofia que resgata as práticas agrícolas tradicionais e os valores mínimos necessários à preservação da vida numa organização sistêmica. Unindo o conhecimento milenar ao desenvolvimento tecnológico, proporciona a integração das propriedades urbana e rural de forma viável, segura e sustentável para todos os seres envolvidos. Cada um tem seu papel valorado, respeitado e responsabilidade com o meio.”
Mas será que isso é possível realmente se vivendo em cidades verticalizadas como São Paulo e Barueri, que caminha para o mesmo destino? A permacultora diz que sim e cita como exemplo a Geocasa criada por ela e onde vive a sua família num bairro populoso da zona oeste da São Paulo. A casa que era tradicional, com quintal de ardósia foi transformada numa casa verde com todos os espaços aproveitados para o cultivo de hortaliças, temperos e frutas. A permacultora conta que economiza mensalmente cerca de R$1200.00 no supermercado, pois, deixa de comprar frutas, legumes, temperos, produtos de limpeza e de higiene pessoal. Tudo isso é produzido pelas técnicas da permacultura em sua própria casa. Além da questão econômica ela aponta para o aspecto da saúde em si, foco principal da permacultura. Cristina ressalta a grande quantidade de agrotóxicos usados no agronegócio brasileiro comprometendo quase tudo o que consumimos. Isso sem falar na questão dos transgênicos, técnica desenvolvida em laboratórios que a partir de cruzamentos que jamais aconteceriam normalmente na natureza, são induzidos e provocados artificialmente com espécies vivas de famílias diversas. Ou seja, manipula-se uma natureza da qual não se tem controle e por isso se desconhece seus efeitos reais na saúde humana.
“Eu tinha o desafio de não colocar uma caçamba na calçada e aí eu fui transformando todo esse processo. Hoje eu consigo dar fim correto a todos os resíduos domésticos na minha casa. Meu absorvente é ecológico, a fralda que meu filho usou é de algodão... Muita coisa mudou, a permacultura promove essa mudança. (...) A gente começa a ter uma relação de amor com todos os seres vivos e com o planeta. Eu distribuo alimentos entre meus vizinhos como o chuchu, a uva no final do ano e o abacate, porque a permacultura respeita a sazonalidade.” – destaca Cristina Brasileira. Insisto na questão dos pequenos espaços urbanos afinal, as grandes metrópoles como São Paulo são constituídas basicamente de altíssimos edifícios. Ela mais uma vez dá como exemplo a sua própria vida: “Eu morei numa quitinete na Bela Cintra (zona central de São Paulo) e eu tinha uma varanda minúscula de dois metros quadrados, eu produzia alface, todos os temperos como tomilho, cebolinha, manjericão, salsinha, coentro e até rabanete eu produzia... Então, a permacultura é excelente em todos os sentidos especialmente nisso, não tem espaço definido, é em qualquer lugar, se tiver luz solar você pode produzir. Estou agora produzindo também shitake, shimeje e vou começar a produzir açúcar mascavo.” A colocação da permacultora se completa quando ela afirma que é possível se fazer uma horta verticalizada com pequenos vasos na parede mesmo, quando não for possível se contar com canteiros no chão.
Como preconiza o Movieco, conhecimento é poder, e sendo assim precisa ser compartilhado. Por isso Cristina Brasileira, - que pensa desse mesmo jeito - abre as portas da Geocasa toda quarta – feira das oito da manhã até o final da tarde para visitas públicas sem custos e também promove cursos. O próximo que vai acontecer na Geocasa é sobre aquecimento de água pela luz solar. Para quem quiser buscar a mudança de paradigma, mais do que isso, buscar uma vida mais humana com o cultivo ao respeito à natureza e ao próprio homem, pode encontrar informações no seguinte grupo de discussões: grupohomemverde@yahoogrupo.com.br ou ainda no email que a eco-designer atende que é itacgm@yahoo.com.br.
Tendo a arquitetura como parceira nessas mudanças o Movieco também levou para o auditório da Câmara municipal, o estudante de arquitetura Anderson Dourado, vencedor do prêmio Alphaville de Urbanismo Sustentável de 2010. O jovem de apenas 23 anos, idealizou um projeto que é calcado em quatro pontos: estudar, habitar, divertir e trabalhar num mesmo espaço que privilegia aspectos como acessibilidade, convivência, permeabilidade do solo, captação de águas das chuvas, praças e parques. Anderson comenta o projeto: “A ideia, foi proporcionar soluções simples para os problemas que envolvem a cidade”.
Quando se fala em cidade, pensa-se logo em trânsito caótico, acúmulo de lixo, enchentes... No caso do lixo, os dados são mais que preocupantes são assustadores! Em São Paulo se produz mais de treze mil toneladas de lixo doméstico diariamente. E metade desse lixo é orgânico, ou seja, matéria rica resultante de alimentos em decomposição, que poderia ser usada em hortas, pomares e projetos de permacultura. Uma verdadeira vitamina para a terra, que separada, torna-se um poderoso adubo para o solo. E qual é a solução que o futuro arquiteto vê para o lixo? “A proposta do meu projeto é a utilização de ar comprimido com uma tubulação específica que é colocada em cada residência. Saí mais barato comprimir o lixo, separando em tubulações que terão cada uma um tipo de lixo diferente como o orgânico e o industrial. A Indústria recolhe o lixo que ela mesma produziu, e o lixo orgânico seria levado para as vias verdes por exemplo.” Completa ele, como já é usado em algumas cidades da Europa.
Pergunto sobre a participação do Movieco em todo esse processo, e Anderson responde: “A importância do Movieco está na conscientização e na educação das pessoas que precisam entender o que é o meio ambiente, o que é educação ambiental. As pessoas não estão cuidando do lar que é o nosso planeta. O Movieco trabalha muito com as crianças e são elas que vão fazer a diferença...”.
Visionários, utópicos, iludidos? Talvez essa ideia possa passar pela sua cabeça quando conhece pessoas como a ambientalista Tânia Mara que dedica sua vida a educação ambiental... Ou ainda a permacultora Cristina Brasileira que trabalha para transformar o seu entorno trazendo prosperidade e alimento... Também o jovem Anderson Dourado que pretende fazer da arquitetura uma ferramenta associada ao conceito da sustentabilidade e da preservação. Porém meu amigo leitor, essas pessoas não são nem visionárias, nem iludidas, muito pelo contrário. Essas pessoas pensam coletivamente, estão buscando num mundo cada vez mais hostil, competitivo e desumano, viver a filosofia deixada por Mahatma Gandhi, ou a Grande Alma, que um dia habitou nosso planeta e disse: “Você deve ser a mudança que quer ver no mundo.”
Eles já começaram... e você?!

sexta-feira, 11 de junho de 2010

Manifestação Indígena na II Semana de Meio Ambiente





Pajé Kaxinawa ensina “homem branco” na II semana do Meio Ambiente em Barueri
Por Priscilla Wilmers Bruce
Ele tem 23 anos. Tímido, dono de olhos negros muito expressivos está vestindo calça jeans, tênis e camiseta. Passaria por um jovem comum entre tantos que andam por aí movidos por ideais e sonhos, construindo suas histórias, não fosse pelo rosto pintado e o lindo cocar que usa sobre os cabelos lisos e brilhantes.
Ele é um índio. Mais do que isso, é um pajé ! Pajé Txana Dasu. Mas como assim pajé? Você, amigo leitor, deve estar se perguntando, pois eu também fiz a mesma pergunta para ele. O próprio explica com uma fala mansa característica dos que usam o tempo sem pressa ou sofreguidão, mas com sabedoria: “Eu sou da tribo Huni Kuin Kaxinawa. Vim do Acre e aprendi a pajelança com a minha mãe. Mas eu também nasci com esse dom, dom de Deus, que a gente recebe. Dom gratuito que não pode ser cobrado. É para ajudar o irmão.”
Sensibilidade e profundidade são marcas da personalidade desse pajé que há sete meses está em São Paulo, na região de Barueri, fazendo o que ele mesmo chama de intercâmbio cultural. Desenvolvendo o xamanismo ele trabalha na sua comunidade com a farmácia natural ou Medicina da Floresta, aquela que considera o homem holisticamente, mais que um corpo a ser tratado. Mais precisamente, um corpo habitado por um espírito, por uma psique, que se relaciona com o meio ambiente permanentemente por ser parte dele.
O xamanismo tem como referência o Universo e os arquétipos do Xamã. Está focado no autoconhecimento, nos dons e potencialidades vindos da percepção, da intuição e da sensibilidade que vai lá, buscar na essência humana o porquê das doenças, das fragilidades. A cura se dá através do uso e manipulação de ervas com banhos, beberagens, chás, defumações. Pesquisas revelam que o xamanismo é prática espiritual das mais antigas na história da humanidade, conta-se mais de cem mil anos. Os índios Kaxinawas, possuem uma visão xamânica baseada no yuxin. O que isso significa? Para eles a espiritualidade não é algo sobrenatural, mas, incorporada à natureza, está na fauna e na flora, em tudo o que os cerca. Essa presença espiritual permeia tudo, é organismo vivo na terra, na água, nos céus. Por isso eles mais que respeitam o meio ambiente, eles o reverenciam. Faz sentido. Sem a sustentabilidade, sem a preservação das florestas para os Kaxinawas não há vida. Assim, para o xamã que procura conhecer e se relacionar com o yuxin, é indispensável o bem estar da sua comunidade. O pajé Txana Dasu comenta que o xamanismo e a pajelança ensinam o homem a valorizar tudo o que é sagrado, o que se sente, o que se sonha, como se vive e se relaciona com a Mãe Terra.
Resgato uma afirmação feita por ele a respeito do bem estar que devemos desfrutar para termos saúde. Pergunto: “Mas pajé então as doenças do homem branco estão relacionadas com o desenvolvimento urbano e o progresso?” A resposta vem acompanhada de argumentação sólida. Diz ele: “O homem branco, das cidades, não tem a mesma compreensão que o índio. O índio nas florestas é muito mais tranquilo. Na cidade você se alimenta com alimentos que não trazem a saúde. O índio já tem uma alimentação diferente do branco. (“...) As doenças, vem surgindo por causa de muita poluição. A Medicina da Floresta limpa o corpo e o espírito”.
Espírito de sobrevivência, diríamos nós se considerarmos a trajetória de nossos irmãos indígenas, olhando a nossa própria história. A comunidade dos Kaxinawas, assim como os Animawa Kampa, os Kutukinas, os Kontanaya e tantas outras que habitavam o alto Juruá enfrentaram dizimação em massa por causa dos processos de exploração. No século dezoito, foram os colonizadores em busca de escravos. No século dezenove, as invasões tornaram-se frequentes em função da borracha, obrigando os índios a mudanças culturais e de convívio que acabaram trazendo doenças para eles desconhecidas até então, como o caso do sarampo.
De acordo com o Censo de 2000 existiam 1400 habitantes da etnia no Brasil, enquanto que na Amazônia Peruana, apontava para 3964 habitantes desta comunidade. Vivendo do manejo de árvores na floresta, plantando especialmente aquelas destinadas à construção de canoas e casas, os Kaxinawas também cultivam feijão, mandioca, milho, banana, abacaxi, amendoim e algodão em roçadas. O algodão é usado intensivamente pelas mulheres Kaxinawas, que inspiradas na habilidade da aranha, tecem lindas esteiras e cestos com desenhos chamados Kene Kuim. Elas usam tinta de jenipapo, para também adornarem seus corpos em festividades como casamentos, passagem da vida infantil para a adulta e outros ritos valiosos na cultura indígena. A caça é de uso exclusivo do homem que profundo conhecedor dos hábitos e costumes dos animais, consegue imitá-los.
E exatamente por causa dessa riqueza cultural e visão sempre atual de preservação e sustentabilidade que o movimento ecológico – Movieco, sediado em Barueri convidou o pajé para uma conversa esclarecedora com o “homem branco” na II semana do Meio Ambiente, realizada no Ganha-tempo, coração do município. Lilian Pereira, que trabalha como controladora de acesso e segurança, passava por ali no momento em que o pajé dava informações sobre os costumes de seu povo. Respeitosa, pediu licença e de posse do microfone disse: “Vocês são verdadeiros heróis, defendendo a Amazônia que é o coração do Brasil.”
Ela tem razão se pensarmos na mensagem que o pajé traz a todos nós para reflexão; diz ele: “O que eu posso dizer com muito respeito e humildade é que o homem branco tenha mais consciência dentro de si e que a Mãe Terra é muito importante para nós, porque é dela que a gente tira o pão nosso de cada dia. Essa terra está sendo explorada; não há compreensão de respeitar. (...) Hoje o homem branco não chega na beira do rio. As florestas não existem mais!”
Nos próximos três anos, o pajé que foi substituído temporariamente na função entre os Kaxinawas, está com uma agenda parecida com a do “homem branco”. Ele viajará pelo Brasil e para a Índia, levando sua mensagem de um mundo mais saudável, sustentável e preservado.

Semana do Meio Ambiente




Educação, teatro e alegria: receita de sucesso da II semana do Meio Ambiente em Barueri
Por Priscilla Wilmers Bruce

O cheiro agradável de flores invadiu o ar acompanhado do violão ritmado. No centro da roda, um índio, o xamã da tribo, médico respeitado por sua ancestralidade, conhecimento e poder, cuida de um homem branco que está morrendo. O elemento feminino se faz presente na personalidade de uma índia que dança, espalhando a cura com ervas escolhidas com propósito definido e muita sensibilidade... Mas ao contrário do que você pode estar imaginando agora, não estamos numa bucólica mata preservada de qualquer ação humana. Estamos no coração de Barueri, no movimentado Ganha-tempo, onde diariamente circulam perto de cinco mil pessoas para resolverem problemas característicos do mais típico processo de urbanização: ali tira-se carteira de indentidade, encontra-se assistência jurídica, busca-se proteção do Procon e tantos outros serviços naturais e necessários para quem vive nas grandes cidades.
Acontece que o Ganha-tempo durante uma semana é o palco escolhido para se pensar, refletir e discutir a II semana do Meio – Ambiente. A iniciativa é do Movieco – Movimento Ecológico ambientalista de Barueri que desde 1998 vem trabalhando na educação ambiental, na região metropolitana do estado de São Paulo e que faz parte da Bacia Hidrográfica do Alto Tietê trecho Pinheiros – Pirápora.
O motorista de ônibus Robson Fernando Magalhães está de pé com a filhinha Sofia adormecida nos seus braços; atento, Robson acompanha as apresentações que se sucedem ali, bem na entrada do Ganha-tempo. Ele veio com a família resolver uma questão de documentos, mas não resistiu, curioso parou para assistir ao grupo Tragôdia Teatral Onírico. O grupo capitaneado pelo ator Adamo Uriel Zilis evoca a carta do chefe Seattle, um dos mais belos e profundos manifestos de respeito à vida e ao Meio Ambiente. A carta foi escrita em 1854 e é endereçada ao presidente dos Estados Unidos, que na época pretendia comprar as terras onde viviam os índios Suquamish, para situá-los numa pequena reserva. O que nós aqui em Barueri e no Brasil temos com isso? Muito mais do que se imagina... A carta do Chefe Seattle é um documento atualíssimo e universal quando se pensa em todo o processo de aculturação ao qual nossos índios tiveram que se submeter. Mais ainda quando se fala em preservação de mata nativa!
Adamo Zilis, o ator que evoca a memória do chefe Seattle comenta: “A mensagem é tão atual. Parece que acabou de ser escrita. (...) É uma semente que fica para a reflexão de todos nós. (...) Eu trago essa particularidade desde a infância. Eu tenho muita afinidade com a cultura indígena, com a preservação da fauna e da flora, que estão ligadas ao xamanismo. Sem isso não tem cura para o índio. O xamã é o médico dos índios. Entre os povos gregos, pelo teatro se buscava a cura e entre os árabes, era a música a responsável pela saúde do espírito.”
Com uma agenda de atividades focada na educação, com múltiplas ações como a coordenação de grupos de estudo, consultoria em gestão ambiental e desenvolvimento de programas em setores públicos e privados, o Movieco, também aposta no teatro como ferramenta lúdica de conscientização e mudança de paradigmas. O projeto “Bicho é o bicho” que tem como
alicerce a literatura, a música e o teatro, também se apresentou no Ganha-tempo para uma plateia pra lá de seleta e entusiasmada: sim você acertou no público-alvo das ações ambientais: as crianças! Afinal é com elas que se dá todo o despertamento da consciência socioambiental. Elas são os agentes multiplicadores mais eficientes na educação de todos nós, os adultos.
A socióloga Lou Spinelli com vinte anos de experiência no Terceiro Setor em instituições nacionais e internacionais em projetos socioambientais, uniu-se a musicista e talentosa cantora paraense Giselle Griz, de olho nesse público que é sintonizado, inteligente e ávido por informação.
Elas trouxeram de casa a história da gatinha seamesa Kira, que ganha as páginas de um lindo livro infantil que leva o pequeno leitor num passeio pelo universo da nossa pungente Amazônia... Não há criança (e adulto!) que não se encante com o enredo criativo, delicado e embalado pelas lindas canções de autoria de Giselle Griz. O livro com Cd foi lançado na XIII feira Pan-amazônica do livro, um importante cenário literário infantil. Para a assessora da Secretaria de Cultura do Pará, Zana Moura, a iniciativa tem um grande peso na educação ambiental privada e pública do estado:“A questão da área ambiental é muito trabalhada na feira Pan-amazônica do livro. Lá existe a parceria com as escolas públicas e privadas. Mas as escolas públicas respondem com oitenta por cento disso.”
Parceria, que as autoras de “Kira” estão buscando em São Paulo como declara Lou Spineli:“Nosso maior objetivo é trabalhar com escolas públicas, movimentos de bairros, ONGs. O que a gente tem procurado fazer e ainda não se concretizou é parceria com os governos, com os municípios para que a gente possa fazer doação de livros e não venda”. Como o projeto “bicho é o Bicho” é independente, Lou Spineli e Giselle Griz estão assumindo todos os custos com o livro, cd e a performance teatral que acompanha a apresentação de “kira” para o publico infantil.
O pequeno Bruno, de cinco anos de idade, filho do motorista de ônibus entrevistado, Robson Fernando Magalhães, teve que sair praticamente arrastado pela mãe da apresentação do “Bicho é o Bicho”. A mãe tinha que trabalhar e o garotinho não conseguia desgrudar os olhos das personagens ali na frente. Só depois de beijos, fotos e abraços, ele se conformou, e de pescoço torto, saiu lançando um olhar “cumprido” para Kira...
É ver para se apaixonar também. Criança sabe o que quer!